Por Diva Braga, artigo publicado originalmente na revista Caros Amigos (especial de agosto de 2011)*
Surgimos em 1997, impulsionados pelos movimentos sociais, especialmente o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)
Nos setores populares e movimentos sociais que não perderam o seu horizonte de esperança, iniciou-se um novo processo de retomada do trabalho de base, da formação e das lutas de massas, recusando-se a se adaptar a uma lógica que transformou a política na “arte do possível”. Isso permitiu que não fossem absorvidos pela lógica eleitoral que hegemonizou o pensamento de esquerda e unificou centenas de militantes pela defesa de uma alternativa popular para o Brasil em contraposição á ao Neoliberalismo.
A ofensiva neoliberal desencadeada na década de 90 deixou marcas profundas nos projetos revolucionários em todo o mundo. Seu impacto mais duradouro foi no terreno da ideologia e, consequentemente na capacidade de acreditar nas revoluções. Diante de uma crise ideológica tão poderosa e de circunstâncias históricas tão desfavoráveis, parecia que só era possível cair na vala da descrença, rebaixando a política ou no sectarismo.
Recusamos essa falsa disjuntiva. Na Consulta Popular se aglutinaram militantes de movimentos sociais que não aceitavam a lógica da política imposta pela esquerda eleitoral, que gradativamente foi rebaixando seu programa e se contentado com a perspectiva de serem apenas gerentes da máquina administrativa. Em outras palavras, abandonando a perspectiva de lutar pela conquista real do Estado. Militantes que não mais aceitavam uma militância paroquial e medíocre.
Também recusamos uma prática sectária que transforma partidos de esquerda em pequenas seitas que pretendem encaixar a realidade em seus manuais. Com isso, aglutinamos lutadores populares que buscavam retomar os ensinamentos revolucionários acumulados pela classe trabalhadora, mas se recusavam a um pensamento eurocêntrico e formalista em que a humanidade está condenada a ser, no máximo, coadjuvante de sua própria história, definida estritamente pela economia.
Nossa proposta principal é contribuir na construção de um Projeto Popular para o Brasil. Defendemos que o povo brasileiro, deve construir um projeto que organize o uso de sua capacidade criativa e produtiva, tendo em vista atingir um futuro desejado. O Projeto Popular é a força social organizada do povo brasileiro lutando para executar seu programa político de mudanças estruturais na sociedade.
Estudando os autores que pensaram profundamente o Brasil, em cursos que chamamos de “Realidade Brasileira”, aprendemos que a burguesia pela natureza capitalista da formação social e econômica de nosso país se mantém umbilicalmente atada à burguesia internacional e ao projeto político do imperialismo. Portanto, não tem interesse e não pode implementar qualquer medida que atenda aos problemas estruturais que conformam o programa de um Projeto Popular. São projetos distintos e incompatíveis.
Em última instância, o elemento definidor desse conflito será o resultado da luta pelo poder entre estes dois projetos. Como nos ensina Florestan Fernandes, as tarefas da revolução nacional, democrática e popular somente podem ser o resultado da ação dos “de baixo”, dirigida pelo proletariado, que envolve seus aliados estratégicos no enfrentamento “contra a ordem”, na luta pelo poder.
Este não é um dilema apenas do povo brasileiro. A crise econômica em curso, que se mostrará profunda e prolongada, coloca o mundo e especialmente a América Latina num dilema: as políticas macroeconômicas desenvolvimentistas aplicadas atualmente se mostrarão insuficientes pelo fato de que as mesmas ainda estão articuladas com o rentismo financeiro que é parte da crise e absorve boa parte da mais-valia social dos países dependentes. Diante disso, os estados nacionais latino-americanos vão se deparar com o desafio de regulamentar seus sistemas financeiros, controlar os fluxos de capitais e proteger os setores estratégicos da economia. Caso contrário, aplicarão as velhas receitas ortodoxas de ajuste fiscal que penalizam a classe trabalhadora.
Diante do aprofundamento da crise, será tarefa dos lutadores e lutadoras populares construírem forças suficientes para apresentar uma alternativa real de poder através de um projeto de mudanças estruturais na sociedade.
Não somos um agrupamento eleitoral. Isso não significa negar a importância das eleições na política, mas romper com a lógica da centralidade na luta eleitoral, nos coloca outro conjunto de esforços, criatividade, paciência e ousadia centrados no compromisso com a Revolução Brasileira.
Entendemos que o formato de cada organização é determinado pelas condições apontadas pela luta de classes. A organização é uma ferramenta e não existem ferramentas universais senão aquelas que são mais adequadas à tarefa que se pretende realizar. A organização está sempre a serviço de uma determinada linha política. Portanto, a Consulta Popular é um meio, não um fim. O motivo de sua existência não é criar mais uma estrutura de poder, voltada para alimentar uma nova burocracia. Em outras palavras, somos uma ferramenta que somente faz sentido enquanto serve para a luta revolucionária.
Nesse momento, consideramos que existem três tarefas centrais na atual conjuntura. É o que chamamos de nosso tripé que funciona como uma bússola de nossas atividades:
- A elaboração teórica e formação política dos lutadores/as do Povo, conhecimento da realidade, recuperação do pensamento socialista histórico, formação de consciência social, valores e capacidade teórica de solucionar problemas na medida em que surgem;
- Construir, impulsionar e estimular as lutas de massa, capazes de alterar a correlação de forças, despertar a consciência social em amplos setores e gerar força social; e
- Construir a organicidade dos lutadores do povo, unir os movimentos sociais e lutadores populares em torno dos mesmos objetivos estratégicos e dotá-los de uma unidade de ação.
Nossa organização é voltada para fora. A Consulta Popular, enquanto organização política, só tem sentido como instrumento de luta. Ocupamos a maior parte de nosso tempo e recursos nas atividades que acumulam forças para transformações na sociedade. Uma organização que se fecha em si própria, que se volta para dentro, que não estabelece ou que perde a ligação com o povo, está condenada à morte.
Trabalhamos o exemplo pedagógico ao invés do discurso. Ante a banalização do discurso se retoma a centralidade na ação como exemplo pedagógico. Priorizamos investir na construção política em torno de ações concretas que possibilitem a construção da unidade das forças populares.
A unidade se constrói na ação. Isso também exige a formação de militantes que não são apenas agitadores e propagandistas, mas construtores nos espaços populares.
A política deve consistir na arte de descobrir as potencialidades existentes na situação concreta de hoje para tornar possível amanhã o que no presente parece impossível. Nossa palavra de ordem é preparar-se. Acumular forças para a construção de um Projeto Popular de transformação da sociedade. Construir hoje as condições que tornarão possível a ruptura revolucionária.
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